domingo, maio 25, 2008

Um milhão de portugueses sofre de doenças da tiróide

Mau funcionamento da tiróide afecta a qualidade de vida

Maria Judite Quental tem 69 anos, mas já se sentiu muito mais velha do que agora. "Sentia-me bloqueada, com falta de memória, sem iniciativa para nada, engordei imenso", conta ao DN. Percebeu que estava doente mas demorou a encontrar respostas: "Fui a muitos médicos mas nenhum me mandou fazer um exame à tiróide. Foi a minha ginecologista que me fez fazer exames." Por essa altura, esta decoradora aposentada já tinha sido obrigada a contratar uma empregada interna: "Tenho quatro filhos e não conseguia orientar a casa, nem conseguia estar sozinha", lembra.

"Quando a minha médica viu os resultados pôs as mãos à cabeça", recorda. Encaminhada para uma consulta de especialidade, no dia seguinte conheceu o endocrinologista Jácome de Castro. O diagnóstico foi fácil: Maria Judite tem hipotiroidismo, uma doença da tiróide. Esta glândula, localizada na base do pescoço, produz hormonas que regulam o metabolismo e interferem com muitos sistemas, "com quase tudo no nosso corpo", explica o endocrinologista. Assim, quando funciona mal, as consequências podem ir do cabelo seco ao cansaço muscular, passando pela intolerância ao calor, perturbações do ritmo cardíaco e a diminuição da fertilidade.

Maria Judite faz parte dos 10% de portugueses que sofrem de doenças da tiróide. Estima-se que outros 10 a 15% tenham disfunções subclínicas, isto é, alterações ligeiras, muitas vezes sem sintomas, acrescenta o médico. No entanto, segundo um estudo da Universidade de Lausana, na Suíça, publicado esta semana, estas disfunções silenciosas aumentam o risco de se sofrer de doenças cardíacas.

As doenças que afectam a tiróide podem dividir-se em dois grandes grupos: aquelas em que a glândula funciona mal porque produz hormonas de forma insuficiente ou a mais, e as doenças em que a tiróide cresce. As primeiras são mais frequentes, mas os casos de nódulos e de cancro têm vindo a aumentar, alerta a Sociedade Europeia da Tiróide.

A subida do número de casos de cancro pode dever-se a um melhor diagnóstico, diz Jácome de Castro, o que, por um lado é positivo, porque a detecção precoce é fundamental para a cura. Mas o endocrinologista prefere realçar que a "esmagadora maioria dos nódulos é benigna": apenas 5 a 10% são malignos. Só nestes casos, ou quando os nódulos crescem de mais e pressionam outros órgãos no pescoço, é necessário retirá-los. A cirurgia "é simples, apesar de ser fundamental que seja praticada por quem tem treino neste tipo de operações", diz.

Já as disfunções de funcionamento, o hipotiroidismo e o hipertiroidismo, são desencadeadas, na maior parte das vezes, por doenças auto-imunes, explica. Não se sabe exactamente porque é que o sistema imunitário inicia uma produção de anticorpos que perturbam o funcionamento da tiróide, mas o aumento do stress, da poluição, do tabagismo e das infecções virais são factores a ter em conta, diz o médico, presidente do Grupo de Estudos para a Tiróide da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo.

Jácome de Castro diz que, para um endocrinologista, as doenças da tiróide são fáceis de diagnosticar e têm um lado "altamente gratificante": a maior parte é fácil de tratar.

Foi esse o caso de Maria Judite. "Passado um mês já estava bastante melhor, senti que tinha menos 20 anos", diz. Já passaram três anos e apesar de ter de tomar a medicação todos os dias, não se sente doente: "Vivo sozinha e consigo fazer aquilo que pensava que nunca mais ia conseguir." Além disso, emagreceu 30 quilos. "Cheguei a pesar 85. Emagreci e rejuvenesci, houve pessoas que pensaram que fiz uma operação estética."

Maria Luísa Júnior, de 55 anos, tem hipertiroidismo. O excesso de hormonas tiroideias começou por fazer com que perdesse peso. "Sentia- -me muito em baixo, mas como a empresa onde trabalhava estava a passar por muitas dificuldades, atribuí os sintomas ao stress." Só quando a estas queixas se juntou um inchaço nas pernas procurou um cardiologista, que a encaminhou para a consulta de endocrinologia. Já passaram 15 anos. "No início foram precisos alguns ajustes na medicação, até encontrar as doses certas, e nisso a empatia com o médico foi fundamental, mas não sinto quaisquer limitações - só tenho de tomar um comprimido por dia."


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