terça-feira, setembro 02, 2008

Sou um Exilado no meu próprio País

Com o nosso agradecimento ao colega, pelo esforço físico e moral e pelo facto de não ter deixado que o medo o dominasse, aqui vai mais uma acha para a fogueira...


Chamo-me António Morais. Sou professor. Aquele professor doido que percorreu 947 km de bicicleta unindo as escolas nas quais teve o privilégio de leccionar e trabalhar com o intuito de chamar a atenção para o que se está a passar na educação.

Há muito tempo que percebi que a educação não está na moda. Quem é que se importa com ela? Talvez o governo se importe um pouco, mas só na justa medida em que possa cortar e limitar os gastos com ela. Eu importo-me muito, e acho sinceramente que este ministério com a sua obsessiva avalanche de mudanças norteadas por princípios exclusivamente economicistas delapidou e destruiu o património da classe docente: a sua dignidade e o seu empenho; e assim deu uma estocada mortal na escola pública. Queria denunciar esta triste realidade e por desgraça descobri algo ainda mais horrível: a existência de indícios muito fortes de que a liberdade de expressão já não mora aqui! Ao longo desta legislatura foram surgindo sinais que pareciam fortuítos e pontuais do cerciar da liberdade de expressão. Agora configuram, para mim, uma clara estratégia sistemática e bem urdida para calar as vozes dissonantes. Foi uma anedota sobre o Primeiro Ministro, que custou o lugar na DREN e um processo disciplinar ao professor que a contou. Lembro que tal piada não foi escutada pela pessoa que sentenciou e pronunciou a pena. Presumo que a anedota deveria ser péssima para ser premiada com tal castigo!!! Foi uma simpática visita realizada por dois amáveis polícias ao sindicato da Fenprof na Covilhã na véspera da visita do Primeiro Ministro àquela cidade, que apenas queriam tomar café. O café dos sindicatos tem outro sabor!!! Foi a preocupação das autoridades em encontrar estacionamento em Lisboa no dia 8 de Março (o dia da Marcha da Indignação) que fez com que fossem às escolas previamente inteirar-se dos professores que iriam para a capital protestar. É excelente termos um governo preocupado com o nosso bem-estar no trânsito lisboeta!!! Foi a proibição dos professores se deslocarem para outras escolas para participarem em reuniões sindicais. Nessas deslocações podem acontecer acidentes, deve ser essa a preocupação que fundamentou esta proibição. A tutela preocupa-se connosco!!! Foi a pretensão da tutela em diminuir a representatividade dos sindicatos e, certamente, continua a ser. Afinal numa altura em que tudo o que pedido pelos trabalhadores é imediatamente concedido pelas entidades patronais… para que são necessários os sindicatos?!!!

Agora os factos estranhos que aconteceram na última etapa da minha viagem “No Trilho da Esperança”, que uniu Alcoutim a Vila Real de Santo António…

Primeiro: duas cadeias de televisão enviaram duas jornalistas e dois operadores de imagem respectivamente que me acompanharam durante uma grande parte desta última jornada e que filmaram a conferência de imprensa improvisada na rua pela impossibilidade de ser realizada dentro da escola.

Segundo: a Escola Básica 2,3 D. José I de Vila Real de Santo António, à hora da minha chegada, que ocorreu por volta das 13.30, estava encerrada, mesmo estando lá dentro pessoal administrativo e auxiliares de acção educativa que se escondiam quando chamávamos para que nos abrissem a porta.

Terceiro: a Direcção Regional de Educação do Algarve não autorizou a que se fizesse a conferência de imprensa no interior da escola.

Quarto: os telejornais das respectivas televisões que se encontraram presentes não deram qualquer notícia referente ao que tinha acontecido durante e no fim desta jornada.

Explicações para estes factos: Primeiro, os jornalistas e os operadores de câmara das respectivas televisões foram filmar-nos com a intenção de passar o tempo e não de veicular qualquer informação. É um bom passatempo!!! Segundo: a escola estava fechada porque era a hora de almoço, mesmo tendo sido avisados e tendo conhecimento que a hora prevista da minha chegada era as 13.00, e os funcionários iam-se escondendo, porque gostam de jogar às escondidas!!! Terceiro: a Direcção Regional de Educação do Algarve não gosta de professores ciclistas e jornalistas dentro da escola, sobretudo em tempo de férias, podem perturbar o normal funcionamento das aulas inexistentes!!! Quarto: a última jornada de uma viagem de protesto de bicicleta pela educação não tem nenhum interesse jornalístico, sobretudo quando a escola está fechada e quando a tutela não autorizou que se fizesse a conferência de imprensa lá dentro. É tudo muito comum e banal para ser notícia!!!

Num regime ditatorial sei que não sou livre para dizer o que quero, mas ao contrário, pensava eu, ingenuamente, num regime democrático tenho liberdade de expressão e as minhas ideias podem ser veiculadas pelos meios de comunicação social. Estava enganado!!! O que é feito do significado da palavra “democracia” e da “liberdade de expressão”? Parece que estou a viver numa “diz que é uma espécie de democracia”, com muito de “espécie” e pouco de “democracia”.

Bom, devem ser tudo coincidências estranhas e eu devo estar num estado de alucinação e ver o que em realidade não existe. A nossa democracia não está bem mas recomenda-se! Recomenda-se um tratamento eficaz para a profunda doença que padece!!!!

António Morais (post roubado ao Blog A Educação do Meu Umbigo)

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